Apesar de medidas de combate, doença que afeta produção de laranja ainda circula em São Paulo após 50 anos

Autor: Agência Bori
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Após cinco décadas de esforços para erradicar o cancro cítrico, uma das doenças bacterianas mais prejudiciais à produção de laranjas, a ameaça ainda persiste nos pomares paulistas. É o que indica um estudo publicado na quinta (16) na revista científica “Microbial Genomics”. Realizado através de parceria entre a Universidade Estadual Paulista (Unesp), a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Metropolitana de Manchester, na Inglaterra, o trabalho detalha a evolução genética da bactéria Xanthomonas citri, causadora da doença, nas regiões produtoras de cítricos do estado de São Paulo. Os resultados podem abrir caminhos para estratégias mais eficazes de combate, considerando as diferenças genéticas das linhagens locais do microrganismo.

Para entender a distribuição e evolução do agente causador do cancro cítrico nos pomares em São Paulo, os pesquisadores recolheram amostras de folhas com sintomas da doença em 13 municípios entre 2018 e 2021. O material resultante foi raspado, tratado e incubado para permitir o crescimento das bactérias presentes, que foram, então, submetidas a análises genéticas. Os dados obtidos foram combinados com informações disponíveis em bancos de dados científicos e permitiram a construção de uma árvore de parentescos para as linhagens de Xanthomonas citri do estado de São Paulo. No total, 1488 conjuntos de genes foram estudados. A equipe ainda investigou e mapeou a distribuição do patógeno em cada região, o que permitiu avaliar como ele se comportou ao longo do tempo no estado.

Os resultados revelaram que tanto linhagens antigas como tipos mais recentes desse microrganismo seguem comprometendo a produção. As variedades identificadas na região pertencem a 7 grupos genéticos diferentes, sendo que o predominante, denominado L7, surgiu junto à expansão da produção de suco de laranja no Brasil, por volta de 1964. Segundo o estudo, esse grupo enfrentou declínio populacional entre 2000 e 2010, período em que o protocolo de erradicação ficou mais rigoroso. No entanto, a partir de 2009, flexibilizações nas normas coincidiram com um aumento na incidência da doença, que subiu rapidamente de 0,14% para cerca de 1% em apenas 2 anos. As conclusões também relatam a presença de uma subdivisão mais recente no grupo, chamada L7.1, que parece ter emergido no estado em meados dos anos 2000.

A persistência simultânea de linhagens diferentes reforça a necessidade de revisar as estratégias em vigência. “Os protocolos de erradicação adotados ao longo dos anos foram, até certo ponto, eficientes em manter níveis baixos da doença; entretanto, ela nunca foi erradicada no país”, destaca Henrique Ferreira, autor principal do estudo. O pesquisador explica que as recomendações atuais combinam diversas frentes, incluindo o uso de barreiras para minimizar o espalhamento da bactéria e, desde 2017, a aplicação de sprays de cobre. “Mas há uma preocupação com o fato de que o cobre é um metal cumulativo e que pode atuar no desenvolvimento de tolerância e, até mesmo, resistência bacteriana a longo prazo”, alerta. “Se tivermos que aumentar cada vez mais a dose de cobre, chegaremos a um cenário de maior contaminação ambiental com menor eficiência do bactericida”, complementa o autor.

Ferreira defende que as conclusões do estudo podem embasar o desenvolvimento de alternativas mais sustentáveis e assertivas de controle, adaptadas às especificidades genéticas das linhagens de cada região. “Com o monitoramento das linhagens, podemos identificar novas introduções da doença, novas variedades, ver como está ocorrendo sua dispersão e o surgimento de características preocupantes, como resistência aos defensivos em uso”, acrescenta.

Ferreira e sua equipe, que está vinculada ao Centro de Pesquisa em Biologia de Bactérias e Bacteriófagos (CEPID B3), planejam aprofundar as pesquisas sobre o cancro cítrico, com foco na busca por substitutos ao uso do cobre. “Pretendemos, por exemplo, avançar em estudos de controle biológico mediado por vírus que infectam Xanthomonas citri e, assim, desenvolver alternativas de controle com o menor impacto possível ao meio ambiente”, prevê. “Com os resultados do nosso estudo, podemos explorar se existem diferenças genéticas e fenotípicas com relação à virulência das linhagens e como as populações de diferentes locais se comportam frente a novos compostos bactericidas”, conclui o pesquisador.

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