Nesta quinta-feira (31), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reuniu-se com governadores no Palácio do Planalto para apresentar uma proposta que visa expandir a atuação da União nas ações de segurança pública. Durante seu discurso, Lula destacou a necessidade de um “pacto” entre os diferentes níveis de governo para enfrentar o crime organizado.
“Logo, logo, o crime organizado vai estar participando de concurso, indicando juiz, procurador, político, indicando candidato. E essa é uma coisa que é quase incontrolável, se a gente não montar um pacto federativo que envolva todos os poderes, que estão envolvidos direta e indiretamente nisso”, afirmou Lula.
O presidente manifestou preocupação com o crescimento da criminalidade organizada tanto fora quanto dentro das penitenciárias. “A gente vê, de vez em quando, falar do Comando Vermelho, do PCC. E eles estão em quase todos os estados, disputando eleições e elegendo vereadores. E, quem sabe, indicando pessoas para utilizar cargos importantes nas instituições brasileiras”, declarou o presidente.
O ministro da Casa Civil, Rui Costa, fez uma análise do avanço do crime organizado no Brasil, observando que a atividade vem ganhando características de máfia e já atua na “economia real”. Para enfrentar esse desafio, Costa destacou a importância de manter uma relação próxima com os estados e revisar a legislação para “encontrar soluções concretas” na área de segurança.
A proposta do governo prevê mudanças estruturais que serão oficializadas por meio de uma emenda constitucional (PEC) a ser encaminhada ao Congresso Nacional. Elaborado pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, o texto foi apresentado aos governadores, com o ministro enfatizando a necessidade de atualizar o sistema de segurança pública, pois o modelo estabelecido pela Constituição de 1988 já não acompanha a complexidade atual da criminalidade, que hoje atua em escalas nacional e transnacional.
O presidente convidou governadores, secretários de segurança, e representantes do Congresso e do Judiciário para um diálogo aberto, a fim de elaborar uma proposta com amplo apoio. A divisão atual de responsabilidades estabelece que a maior parte das atribuições de segurança cabe aos estados, enquanto a União assume uma posição de defesa. A nova proposta busca integrar melhor as polícias, fortalecer o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e ampliar as atribuições da União.
Entre as principais mudanças propostas pela PEC estão:
Status Constitucional ao SUSP: A proposta visa incluir o Sistema Único de Segurança Pública na Constituição, reforçando sua legitimidade.
Competências da União: A PEC permitirá que a União defina diretrizes para a política de segurança pública e para o sistema penitenciário, em conjunto com os estados.
Atualização das Competências da PF e PRF: A proposta estabelece que a Polícia Federal atuará no combate a crimes ambientais, organizações criminosas e milícias de impacto interestadual ou internacional, enquanto a PRF ampliará seu campo de atuação para ferrovias e hidrovias federais.
Padronização de Protocolos e Dados: A PEC propõe a padronização de documentos como boletins de ocorrência e mandados de prisão, seguindo o modelo de unificação do SUS.
Constitucionalização do Fundo Nacional de Segurança Pública: O fundo contará com recursos fixos para subsidiar projetos de segurança pública e política penitenciária.
No entanto, alguns governadores oposicionistas criticaram a proposta, considerando “inadmissível” qualquer medida que reduza o poder dos estados sobre suas forças policiais. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), reafirmou que “qualquer invasão nas posições que os estados têm em termos de poder da sua polícia civil, militar e penal… é inaceitável”.
O governo federal, por sua vez, assegura que a proposta, caso aprovada, não representará interferência nas competências estaduais. Lewandowski afirmou que o objetivo é aumentar a eficácia no combate ao crime organizado, especialmente contra facções que têm ampliado sua atuação no país.
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), criticou o fato de os governadores não terem recebido a proposta antes da reunião, declarando: “A gente entra na reunião cego, sem saber o que vai vir de texto. Tem que entender na prática o que vai mudar na nossa vida”. Antes da reunião, ele sugeriu a exclusão dos gastos em segurança das limitações da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Por outro lado, o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), que apoia Lula, mostrou-se favorável ao conceito da proposta, embora aguarde os detalhes finais. Para Casagrande, “Constitucionalizar o sistema único de segurança pública, integrar ações, a gente fortalecer o trabalho de inteligência, padronizar procedimentos, documentos, softwares, isso tudo pode e vai ajudar com certeza a enfrentar os criminosos”.